22 November, 2013

Para as fronteiras de mim mesmo



Sinto minha alma
gritando em vão
para o mundo,

por um ligeiro segundo
volto a refletir
se estou errado
ou tudo é pele,

mas no próximo instante
meu semblante muda
e começo a crer
que não é necessário chorar,

mas – percebendo ou não –
eu choro, e meus olhos
encobrem a janela clara
que me traz o horizonte,

sinto que sou a própria fonte
daquilo que desejo pro mundo,
ou uma misera ponte
que leva á uma jornada de nervos e pele,

e nesses precipícios que a primavera
guarda em si mesma, sinto-me ocaso
que desconhece a força da própria luz,

entretanto, crio certas raízes
ao longo dessa tarde viscosa
que se concentra sobre meus óculos,

sigo respirando porque me sei morto,
e não importa a qualidade do que respiro
até porque, como os gases, a morte se mostra inebriante,

a morte se mostra inebriante,
porém ainda existe o vicio da vida,
que sacrifica as tristezas de quem já morreu.

12 October, 2013

MEU TESTAMENTO

“Morre comigo um artista" Nero

Aos meus amigos, deixo o amor.
Aos inimigos, deixo uma guerra.
As mulheres que amei, deixo a lembrança
As que não pude amar, deixo o que não pude ser.
Á minha família, deixo o filho que fui;
Aos filhos que não tive, deixo a certeza de terem bons pais;
Comigo morrem meus versos.
Comigo morrem as estrelas que admirei,
Comigo morrem meus caminhos, embora as estradas permaneçam.

Fui um homem feliz, mas infelizmente isso não bastou.
Fui um homem que não bastou em si mesmo, sempre precisou dos outros...
Fui um homem, hoje sou morto, amanhã serei verme...
Um verme, a melhor coisa que eu já fui...

30 September, 2013

SEGUNDA CICATRIZ DA PRIMAVERA



A primavera costura
sua primeira rosa,
através das rotas
de um sonho, 

a vejo chegar e partir
com a mesma precisão
de aliança, em casamento
com as horas da alma,

pelas portas, pelas janelas,
sobre a pele, entre os pelos,
a vejo fluir (duramente)
como água que não se conhece.

Eis que adentro meu sonho
e nele sinto a primavera,
tudo o que haveria nela,
se eu não fosse o que sou.

E tudo o que haveria em mim
se, um dia, eu pudesse
ser essa primavera fria
que, entre lama e asfalto, se aloja.

24 September, 2013

CICATRIZ DA PRIMAVERA



De repente, olho um quadro cheio de flores...

Me lembro que é primavera
Meus sentidos florescem e eu escrevo
As palavras que brotam são mais profundas,
Pois revelam que as primaveras também passam,
Passam deixando na gente um rastro de flor
Um rastro que se alastra em feixes
De sombra e de luz....

07 September, 2013

GAROA



pela janela do trem
observo a garoa,
recordação distante de mim mesmo;
do quanto estou só e ninguém sabe,
do quanto eu já chorei e ninguém notou...

eu sempre levava comigo essa culpa:
não saber amar como os gregos amavam a sabedoria,
hoje eu sei (e isso aprendi olhando a garoa)
que saber amar é paz madura
e eu ainda preciso me despojar
para chegar até mim mesmo,
no esmo da noite ou do dia.

eis que meu peito silencia
quando constato essa etapa em que me encontro
sirvo-me do amor e da procura
e aguardo, passivamente, a tempestade...
possivelmente ela virá
em minhas lembranças ou sobre as retinas,
sobre as úmidas retinas
do espelho, que reproduzem a miragem desse amor,
desse amor triste e condicional
(como certos tipos de liberdade segundo a justiça)

e eis que vejo pensando e sentindo tudo isso
sem que o passageiro ao meu lado imagine...
talvez, aos olhos dele, o mais importante seja a garoa...

22 August, 2013

MESES SE PASSARAM


Meses se passaram e a sombra ainda permanece.
Em cada canto da rua, ela se revela sinuosa.
E eu sigo atrás, tentando reaver o que você era.

Mas o que encontro é simplesmente um espectro
Das esperanças que eu cultivava em minha alma...

Fui adiante, fiz meu caminho entre outras rotas,
Enlacei-me em lençóis de ferro e de erro, mas
Continuo dormindo só e pensando no que seria.
No que haveria nos Domingos que não ocorreram.

Sinto que é saudade, e aceito – resignado – a lembrança.
Enquanto meus olhos formulam um pranto provisório.

Hei de chorar? Não sei. Hei de morrer dessa dor? Acho que não.
Mas não posso, de maneira alguma, evitar essa lembrança.
Porque ela ainda constrói um pedaço do que quero ser...