27 November, 2012

PROFUSÕES ENTRE A VIDA E A MORTE

Em um dia nublado;
um dia de engano e esperança;
um dia íntimo sem calendário;
o último dia sobre os demais,
eu me prostrei ante a morte
e meu coração, enfim, silenciou.

Pude reconhecer-me, só e sem lembranças.
Só e sem lembranças, como um nascituro
em um berço hospitalar.
Pude reconhecer-me, meu peito arrebentou.
Fui internado no mesmo hospital onde nasci,
só e sem lembranças.

Deram-me anestesia, soro. Solicitude.
Deram-me, mas eu não quis.
Procurei meu berço em todos os andares,
mas não havia registro algum nos prontuários.
Era sinal de que eu não estava pronto para (re)nascer.

Eu começava a entender
que reconhecer-me não era o bastante.
Eu precisava forjar outros ombros,
capazes de suportar as asas e a indiferença,
as asas indiferentes.

Porém, para que um novo ombro se forjasse,
era necessário renascer.

Era necessário renascer, e eu não estava pronto.
Eu estava sem mãe e o hospital não tinha proveta.
Provavelmente eu não nasceria naquele dia.
Talvez em outro, disperso sobre o Outono.
Um dia nublado? Nulo?
Extraído á força do tempo e do fórceps.
Extraído do ventre de minha mãe ausente
e dos músculos da morte,
extraídos de um berço hospitalar.