MADRUGADA

Um adeus cortou meus pulsos.

Abri a janela e olhei a lua
Enquanto o sangue caia.
Meus pulsos estalavam
Em contato com a atmosfera
Daquela madrugada.
Caíram as lágrimas
Eu chorei, mas, depois,
Renasci das lágrimas
Que sobraram em meus olhos.
Foram elas que me fizeram ver
O novo dia que entrava pela janela.

O ADEUS

Eu vejo o adeus não como um final
Mas como a retomada de um voo.
Nenhuma árvore cresce
Sem que a semente morra,
Sem que a água afogue
A terra seca, de onde nasce
Uma estrada que vai dar no sol.

AS MURALHAS

Do outro lado do meu dia
Vejo seu rosto.
Tenho a impressão
De que vou tocá-lo a qualquer momento,
Mas minhas mãos não alcançam.
E eu não sei romper esse muro
Que aprisiona a você e a mim.
Eu não sei...
Mas encontro uma porta.
A porta é falsa.
A noite é densa
E a névoa derrete minhas mãos.
Já não posso esmurrar os tijolos
Ou tocar em você.
Só posso olhar por cima das muralhas do amor
E ver que outro dia se aproxima.
Vejo seu rosto do outro lado
E percebo que estou preso a você
No muro que te aprisiona.

A ARQUEIRA E O ESCRAVO

Sou escravo de teus olhos profundos,
De teus lábios, de tua voz branca.
Sinto-me atado a ti como São Sebastião numa árvore.

Tenho uma flecha no peito.

Tenho uma flecha no ombro.
Sou marcado pelas dores sem remédio.

Atiras mais uma flecha enquanto grito

Sei que ainda não vou morrer, mas
a visão se enevoa, voam meus sentidos,
ouço teu riso...cada vez mais distante.

E a noite cai.

Sinto que continuarei teu escravo em outro mundo.

Sinto que em breve meus braços estarão soltos
e eu poderei sentir sua pele, ampla e imaculada.
Ouvirei teu riso mais de perto,
no intervalo entre minha morte e o Juízo Final.

PAIXÃO

Coração fora de rota
sob tarde paralela.

Dois olhares se procuram

na face da lua.

Sem destino, seguem

pela vida.

Uma canção perene...

nada além de outro fim.

AURORA TRIUNFANTE

E vencemos...mesmo no medo,

na dor...merecemos outra manhã
no horizonte, sobre o tempo presente.

Merecemos finalmente a aurora triunfante,
semblante de sol sobre a luta,
lua para redimir aqueles choraram,

aqueles que choraram na luta,

os que permaneceram fortes quando não havia sonho,

os que sonharam quando não havia forças.

E vencemos...mesmo assustados,

vencemos um combate avançado

quando mais ninguém vibrava na rua

 

vencemos a noite escura

e sobre a claridade desse amor

repousaremos.