um dia de engano e esperança;
um dia íntimo sem calendário;
o último dia sobre os demais,
eu me prostrei ante a morte 
e meu coração, enfim, silenciou.
Pude reconhecer-me, só e sem lembranças.
Só e sem lembranças, como um nascituro 
em um berço hospitalar.
Pude reconhecer-me, meu peito arrebentou.
Fui internado no mesmo hospital onde nasci,
só e sem lembranças.
Deram-me anestesia, soro. Solicitude.
Deram-me, mas eu não quis.
Procurei meu berço em todos os andares, 
mas não havia registro algum nos prontuários.
Era sinal de que eu não estava pronto para (re)nascer.
Eu começava a entender 
que reconhecer-me não era o bastante.
Eu precisava forjar outros ombros,
capazes de suportar as asas e a indiferença, 
as asas indiferentes.
Porém, para que um novo ombro se forjasse, 
era necessário renascer.
Era necessário renascer, e eu não estava pronto.
Eu estava sem mãe e o hospital não tinha proveta.
Provavelmente eu não nasceria naquele dia.
Talvez em outro, disperso sobre o Outono.
Um dia nublado? Nulo?
Extraído á força do tempo e do fórceps.
Extraído do ventre de minha mãe ausente 
e dos músculos da morte, 
extraídos de um berço hospitalar.
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